Name: | Description: | Size: | Format: | |
---|---|---|---|---|
25.04 MB | Adobe PDF |
Authors
Advisor(s)
Abstract(s)
O sobreiro (Quercus suber L.) é uma espécie autóctone que se encontra
distribuída em todo o território de Portugal Continental. São excepção as regiões
montanhosas mais frias do norte e centro, as regiões salinas junto ao litoral e as zonas
do interior de acentuada aridez. Os indivíduos desta espécie apresentam características
morfológicas muito variadas com ocorrência de diversas gradações entre caracteres do
mesmo órgão e diferentes graus de tolerância, aparente, à doença do declínio. A
semelhança genómica descrita dentro do género Quercus determina a ausência de
barreiras reprodutivas e possibilita fenómenos de hibridação nos povoamentos mistos de
Q. suber e Q. rotundifolia. O recurso à análise do DNA para determinação do perfil
genético dos indivíduos de uma espécie, consiste no método mais recente de
individualização biológica.
No presente estudo, foi avaliada a variabilidade genética em Q. suber por AFLP
(amplified fragment length polymorphism), com cinco combinações de primers
diferentes, que permitiram diferenciar 313 árvores provenientes do Algarve, Alentejo e
Trás-os-Montes, de acordo com o seu genótipo. O perfil genético de cada sobreiro
resultou da análise de 291 loci aleatórios do genoma, presentes na forma de fragmentos
monomórficos e polimórficos. A avaliação quantitativa das semelhanças ou
dissemelhanças entre os indivíduos foi determinada pelo método de análise de
dados/taxonomia numérica. A percentagem de polimorfismo detectada nos sobreiros é
de 71 % e é indicadora de índices elevados de variabilidade na espécie. A diversidade
genética é semelhante nas populações estudadas do Algarve, Alentejo e Trás-os-Montes.
A elevada variação fenotípica que se observa em Q. suber ao nível da qualidade da
cortiça produzida e da aparente tolerância à doença do declínio é reflectida nos padrões
AFLP. Os valores dos coeficientes de semelhança genética variam entre 0,88 e 0,61, o
que significa que, apesar da elevada diversidade genética, os sobreiros partilham entre si
60 % do genoma. No grupo dos 313 indivíduos de Q. suber observa-se uma tendência
para a separação em dois subgrupos.
Na análise por AFLP com uma das combinações de primers, a combinação I9,
foram incluídas 52 azinheiras provenientes das mesmas três regiões, Algarve, Alentejo e
Trás-os-Montes, dos sobreiros. Duas destas azinheiras foram estudadas, também, com
as outras quatro combinações de primers referidas para os sobreiros. Em todas as combinações de primers houve diferenciação entre os 313 indivíduos da espécie Q.
suber e os dois indivíduos da espécie Q. rotundifolia, em concordância com a
classificação sistemática destes Quercus. Na análise em que se incluíram as 52
azinheiras e os 313 sobreiros, identificaram-se indivíduos pertencentes a uma terceira
espécie. Através da determinação de perfis genéticos de indivíduos de espécies
diferentes do género Quercus é possível determinar as relações filogenéticas existentes
entre eles. Um dos 291 marcadores AFLP está presente em quase todas as azinheiras e
em onze sobreiros e este facto revela que pode ter sido adquirido por hibridação entre as
duas espécies de Quercus. A metodologia usada permitiu identificar marcadores
moleculares potencialmente correlacionados com fenótipos de tolerância à doença do
declínio e à qualidade da cortiça. Alguns marcadores só estão presentes em sobreiros de
determinada região e podem ser o resultado dum processo de adaptação ao meio.
Em Portugal e Espanha a doença do declínio afecta, de um modo geral, os
povoamentos de sobreiro e azinheira, atinge indivíduos de todas as idades e manifestase
na forma de declínio lento ou morte súbita. O fungo do solo, Phytophthora
cinnamomi, aparece invariavelmente associado aos locais de declínio e tem sido isolado,
com frequência, a partir de raízes de sobreiros e azinheiras. Q. suber e Q. rotundifolia
são, portanto, hospedeiros de P. cinnamomi e o fungo é capaz de colonizar os tecidos,
sendo desconhecidos os mecanismos moleculares da interacção entre o hospedeiro e o
agente patogénico.
Através da análise do RNA mensageiro, por cDNA-AFLP, de raízes de Q. suber
e Q. rotundifolia infectadas com P. cinnamomi, de folhas de plântulas de sobreiros
cultivados em solos artificialmente infestados e de folhas de sobreiros localizados em
locais de declínio, naturalmente infestados com o fungo, foram identificados fragmentos
de genes que se expressam de forma diferencial durante a interacção. As sequências de
quatro destes fragmentos apresentam homologia com genes relacionados com o sistema
de defesa noutras espécies de plantas. As sequências nucleotídicas foram determinadas a
partir dos cDNAs correspondentes obtidos por RACE-PCR ou, alternativamente, a
partir dos genes isolados num banco genómico de Q. suber em Lambda FIX II
escrutinado com sondas específicas. Foram identificados e caracterizados em Q. suber,
os genes QsCAD1, QsRPc, QsPDI e QsRSH que codificam uma cinamil álcool
desidrogenase 1, uma proteína de resistência a P. cinnamomi, uma isomerase de pontes
dissulfureto proteica e uma proteína do tipo RelA/SpoT, respectivamente. Pelo menos três destes genes estão potencialmente envolvidos na resposta à infecção por P.
cinnamomi; com efeito a expressão de QsCAD1, QsRPc e QsPDI aumenta durante as
primeiras 24 horas de interacção.
É conhecido que o sistema de defesa nas plantas é multifacetado e que a
transcrição dos genes do metabolismo de fenilpropanóides é activada durante a
interacção com agentes patogénicos. A partir de fragmentos obtidos por PCR com
primers de sequência heterogénea definidos a partir de sequências conhecidas de genes
do metabolismo de fenilpropanóides doutras espécies de plantas, foram determinadas
sequências nucleotídicas parciais codificando uma peroxidase (QsPOX), uma cinamil
álcool desidrogenase 2 (QsCAD2) e uma fenilalanina amónia liase (QsPAL) em Q.
suber. Com base nesta informação foram clonados, sequenciados e caracterizados,
parcial ou completamente, o cDNA e/ou DNA dos genes QsPOX (1 e 2), QsCAD2 e
QsPAL que codificam duas peroxidases catiónicas, uma cinamil álcool desidrogenase e
uma fenilalanina amónia liase, respectivamente. A expressão destes genes foi analisada
por RT-PCR e hibridação com sondas específicas marcadas com digoxigenina, a partir
de RNA total extraído de raízes de Q. suber que estiveram em contacto com o fungo
durante 24 horas, verificando-se que QsPOX2 e provavelmente, QsPOX1, estão
envolvidas na resposta de defesa. Relativamente aos genes QsCAD2 e QsPAL os
resultados não foram conclusivos.
Tendo em consideração a homologia entre as sequências de aminoácidos
deduzidas dos genes identificados em Q. suber com a de proteínas já caracterizadas
noutras espécies, foi possível conceber um modelo hipotético que ilustra os
acontecimentos iniciais da interacção entre o fungo e o hospedeiro. Deste modo,
considera-se que a infecção de Q. suber por P. cinnamomi apresenta contornos de
interacção compatível e incompatível. O fungo induz a expressão de genes
potencialmente implicados na desactivação de factores de virulência (toxinas) e de
genes de defesa implicados no reconhecimento de factores de avirulência. A variante da
doença do declínio denominada “morte súbita” estaria associada à produção duma
isoforma do produto do gene QsCAD1, incapaz de converter o factor de virulência
(toxina) produzido pelo fungo, num produto não tóxico para a célula. Num sobreiro que
sofreu morte súbita foi identificado um fragmento polimórfico deste gene que apoia esta
hipótese. O declínio lento resultaria da resistência parcial ao fungo, relacionada com a
rapidez de reconhecimento dos factores de avirulência.
Description
Keywords
Quercus suber Biodiversidade molecular Phytophthora cinnamomi Sobreiro Declínio do sobreiro Variabilidade genética