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Abstract(s)
Crianças com temperamento inibido tendem a apresentar reações de inibição, vergonha, preocupação e retraimento perante pessoas ou situações desconhecidas, características estas que parecem demonstrar ser estáveis ao longo do tempo. Este tipo temperamento está frequentemente associado a um risco acrescido de desenvolver perturbações emocionais na adolescência e na idade adulta, como a ansiedade social, uma condição que pode ter consequências severas no dia-a-dia dos sujeitos. Dada a prevalência significativa na infância e o impacto potencial a longo prazo, a avaliação precoce do temperamento inibido revela-se essencial. Para o efeito, recorrem-se frequentemente a medidas de relato parental, relato de educadores e, de forma menos comum, a medidas de observação. A abordagem multimétodo é frequentemente privilegiada, uma vez que proporciona uma avaliação mais completa e descritiva do funcionamento da criança em diferentes contextos. Do nosso conhecimento, são escassas as medidas para avaliar o temperamento inibido na infância adaptadas à população portuguesa. Neste contexto, os nossos dois primeiros estudos (Capítulo 2) visaram validar duas medidas de temperamento inibido em crianças: uma medida de observação (Estudo 1) e uma medida de relato parental e de educadores (Estudo 2). No primeiro estudo, aplicámos uma bateria de observação em conjunto com um questionário de relato parental a crianças entre os três e os nove anos. Os resultados demonstraram que a medida observacional tem uma convergência moderada com o instrumento de relato parental, revelando-se uma medida válida que pode ser integrada numa abordagem multimétodo para avaliar o temperamento inibido em crianças portuguesas. No segundo estudo, foi aplicado um instrumento de relato parental e de educadores de temperamento inibido, a ser validado, juntamente com uma subescala de avaliação do temperamento inibido já existente e um instrumento de ansiedade social para o estudo da sua validade. Os resultados indicaram que a medida de relato (parental/educador) é válida e fiável para avaliar o temperamento inibido em crianças portuguesas, evidenciando uma boa concordância entre pais e educadores, uma robusta validade convergente e sensibilidade para discriminar os diversos contextos em que o temperamento inibido se manifesta.
Com duas medidas válidas e adequadas para avaliar o temperamento inibido em crianças, o nosso próximo objetivo foi investigar a trajetória do temperamento inibido e o seu papel na etiologia e manutenção da ansiedade social. Embora o temperamento inibido seja amplamente reconhecido como o principal fator predisponente para o desenvolvimento de ansiedade social, nem todas as crianças com temperamento inibido acabam por manifestar ansiedade. Além disso, nem todos os indivíduos que desenvolvem ansiedade social possuem ou apresentam histórico de temperamento inibido. Assim, compreender os fatores que influenciam a estabilidade e evolução do temperamento inibido, bem como a sua interação com variáveis cognitivas e emocionais, é crucial para desvendar o percurso patológico e intervir precocemente. Entre os fatores que podem influenciar o desenvolvimento do temperamento inibido e, consequentemente, da ansiedade social durante a infância, destacam-se as características parentais, que podem exercer influência através de vias biológicas ou por modelagem comportamental. Destacam-se, neste contexto, a própria ansiedade social dos pais e os estilos parentais, como a superproteção. Desta forma, no terceiro estudo desta tese (Capítulo 3), investigámos como as características parentais e o temperamento inibido interagem para contribuir para a manifestação de sintomas de ansiedade social. Foram avaliados pais e mães de crianças em idade pré-escolar, que responderam a um conjunto de medidas de autorrelato destinadas a avaliar a superproteção, a ansiedade social dos pais, e o temperamento inibido e ansiedade social das crianças. Os resultados revelaram uma associação direta, moderada e positiva, entre o temperamento inibido e a ansiedade social das crianças, independentemente do género da criança ou da influência parental. Relativamente às características parentais, verificámos que a ansiedade social das mães influenciava diretamente a ansiedade social das crianças, e que a superproteção atuava como mediadora do efeito da ansiedade social de ambos os pais sobre a ansiedade social das crianças. Contudo, o papel mediador da superproteção parece variar de acordo com o género dos pais e das crianças. Em suma, estes resultados destacam não apenas o papel central do temperamento inibido, mas também a influência das características dos progenitores — tanto pais como mães — como uma via alternativa e relevante na etiologia da ansiedade social nas crianças. Para além das características parentais, a literatura tem destacado fatores individuais da criança como potenciais moderadores ou mediadores da relação entre o temperamento inibido e a ansiedade social. Entre esses fatores, incluem-se o viés 9 atencional para a ameaça e a maturação cognitiva — refletida no controlo cognitivo e na flexibilidade cognitiva —, assim como a capacidade de regulação emocional. Estes processos desempenham um papel importante no desenvolvimento do temperamento inibido e podem hipoteticamente aumentar ou reduzir a vulnerabilidade à ansiedade. Estudos anteriores indicam que crianças com temperamento inibido tendem a apresentar um viés atencional para a ameaça, o que pode aumentar a sua vulnerabilidade ao desenvolvimento de ansiedade. Adicionalmente, quando o temperamento inibido é combinado com um elevado controlo inibitório, poderá atuar como um fator de risco para o desenvolvimento de ansiedade social. Pelo contrário, a flexibilidade cognitiva e o recurso a estratégias ativas de regulação emocional têm sido apontadas como fatores de proteção. Contudo, a utilização de metodologias inadequadas para a faixa etária infantil e o foco em estudos transversais têm frequentemente resultado em conclusões inconsistentes e pouco consensuais na literatura. Deste modo, o objetivo do último e quarto estudo (Capítulo 4) foi avaliar, através de uma metodologia longitudinal, o desenvolvimento do temperamento inibido e a relação deste com a ansiedade social ao longo de três anos, analisando o impacto de caraterísticas parentais, variáveis cognitivas e emocionais nesta trajetória. Para o efeito, crianças entre os três e os nove anos de idade foram avaliadas em três momentos distintos ao longo de três anos, com foco na ansiedade social e superproteção dos pais e no temperamento inibido, ansiedade social, controlo inibitório, flexibilidade cognitiva, viés atencional e regulação emocional das crianças, com recurso a medidas de relato parental, tarefas comportamentais e técnicas de rastreamento ocular. Os resultados indicaram que além dos fatores parentais como a ansiedade social e o temperamento inibido, as funções cognitivas e emocionais foram identificadas como essenciais na compreensão da trajetória do temperamento inibido. Melhores níveis de regulação emocional, bem como de controlo inibitório e flexibilidade cognitiva, e ainda um viés atencional direcionado para estímulos positivos demonstraram estar associados a uma diminuição do temperamento inibido ao longo do tempo, enquanto um viés atencional direcionado para estímulos não sociais parece estar associado a uma diminuição mais lenta do temperamento inibido. A relação entre o temperamento inibido e a ansiedade social foi confirmada através de uma análise cross-lagged. O temperamento inibido demonstrou uma influência causal forte sobre a ansiedade social que foi particularmente acentuada em crianças com 10 um viés atencional para estímulos negativos e não-sociais, sugerindo que o viés atencional amplifica a conexão entre o temperamento inibido e a ansiedade social. As análises de moderação moderada mostraram que as funções executivas, especificamente o controlo inibitório e a flexibilidade cognitiva, moderaram a relação entre o temperamento inibido e a ansiedade social, particularmente na presença de viés atencional. As crianças com maior controlo inibitório e maior flexibilidade cognitiva apresentaram uma relação mais fraca entre o temperamento inibido e a ansiedade social, o que indica que estas funções executivas ajudam a mitigar o impacto do viés atencional no desenvolvimento da ansiedade social. Crianças com maior latência para fixar o olhar em rostos zangados e com menor controlo inibitório mostraram uma maior propensão para desenvolver ansiedade social. Por outro lado, as crianças com maior flexibilidade cognitiva mostraram uma relação mais fraca entre o temperamento inibido e a ansiedade social, mesmo na presença de vieses atencionais prejudiciais, sugerindo que a flexibilidade cognitiva pode ajudar a gerir os vieses atencionais de forma mais adaptativa. Estes resultados oferecem uma compreensão significativa da trajetória desenvolvimental do temperamento inibido e o seu papel na predisposição das crianças para a ansiedade social e enfatizam a importância de considerar múltiplos fatores na avaliação e intervenção no temperamento inibido e na ansiedade social. Em suma, os estudos incluídos nesta tese apresentam evidências de que: 1) a abordagem multimétodo parece ser a mais fiável na avaliação do temperamento inibido infantil; 2) o BIQ e o Lab-TAB parecem ser medidas válidas e fiáveis para a avaliação do temperamento inibido em crianças portuguesas; 3) a ansiedade social e a superproteção parental têm uma influência significativa sobre a ansiedade social das crianças que não depende do temperamento inibido, mas do género da criança e dos pais; e 4) o viés atencional, o controlo inibitório e a flexibilidade cognitiva parecem intervir como moderadores e a regulação emocional como mediador cujo impacto parece ser significativo no desenvolvimento do temperamento inibido para ansiedade social.
Behavioral Inhibition (BI) is characterized by inhibition, shyness, worry, and withdrawal in unfamiliar situations. It shows moderate stability over time and is linked to an increased risk of emotional disorders, especially social anxiety (SA), impacting children's socioemotional development. Given its prevalence and potential consequences, early assessment of BI is crucial, often involving parent reports, educator reports, and observational methods. However, there are few validated measures specifically adapted for the Portuguese population, highlighting the need for culturally appropriate assessment tools. Thus, the first two studies of this thesis aimed to validate two BI measures in Portuguese children: the first study found that the observational measure moderately correlated with parent reports, supporting its validity as part of a multi-method approach. The second study validated a parent/educator report measure of BI, confirming its reliability and ability to assess BI in various contexts. Given these validated tools, the next objective was to explore BI's role in the development of SA. Although BI is a key predictor of SA, not all children with BI develop SA. Thus, understanding factors affecting BI's trajectory is critical. Results of the third study showed a moderate, direct link between BI and SA, and maternal SA directly influenced child SA, with overprotection acting as a mediator, varying based on the gender of parents and children. The final study used a longitudinal design to explore how cognitive and emotional variables influence the trajectories of BI and the manifestation of SA. Results indicated that attentional bias, emotional regulation, inhibitory control, and cognitive flexibility played critical roles in shaping BI's trajectory. BI strongly predicted SA, especially in children with attentional biases towards negative stimuli, highlighting the moderating role of executive functions and emotional regulation in mitigating the BI-SA relationship. The findings underscore the importance of considering multiple factors in assessing and intervening in BI and SA.
Behavioral Inhibition (BI) is characterized by inhibition, shyness, worry, and withdrawal in unfamiliar situations. It shows moderate stability over time and is linked to an increased risk of emotional disorders, especially social anxiety (SA), impacting children's socioemotional development. Given its prevalence and potential consequences, early assessment of BI is crucial, often involving parent reports, educator reports, and observational methods. However, there are few validated measures specifically adapted for the Portuguese population, highlighting the need for culturally appropriate assessment tools. Thus, the first two studies of this thesis aimed to validate two BI measures in Portuguese children: the first study found that the observational measure moderately correlated with parent reports, supporting its validity as part of a multi-method approach. The second study validated a parent/educator report measure of BI, confirming its reliability and ability to assess BI in various contexts. Given these validated tools, the next objective was to explore BI's role in the development of SA. Although BI is a key predictor of SA, not all children with BI develop SA. Thus, understanding factors affecting BI's trajectory is critical. Results of the third study showed a moderate, direct link between BI and SA, and maternal SA directly influenced child SA, with overprotection acting as a mediator, varying based on the gender of parents and children. The final study used a longitudinal design to explore how cognitive and emotional variables influence the trajectories of BI and the manifestation of SA. Results indicated that attentional bias, emotional regulation, inhibitory control, and cognitive flexibility played critical roles in shaping BI's trajectory. BI strongly predicted SA, especially in children with attentional biases towards negative stimuli, highlighting the moderating role of executive functions and emotional regulation in mitigating the BI-SA relationship. The findings underscore the importance of considering multiple factors in assessing and intervening in BI and SA.
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Keywords
Temperamento inibido Ansiedade social Avaliação Multimétodo Longitudinal Infância
